Somos Madrastas: a maior comunidade brasileira de mulheres que se tornaram madrastas

“É preciso toda uma aldeia para educar uma criança, diz o provérbio africano”, e nessa aldeia também deve ser incluída a madrasta. Idealizado por Mariana Camardelli, o perfil do Instagram @somos.madrastas foi criado em 2019 e conta com 74 mil seguidoras, tendo como objetivos acolher mulheres que assumem a função parental, ser uma rede de apoio no enfrentamento da solidão, da invisibilidade e da importância da inclusão da madrasta no contexto da nova família. 

Mariana Camardelli é educadora parental, terapeuta, especialista em Inteligência Emocional, embaixadora do @mustelabrasil e autora do livro “Madrasta também educa?”. É madrasta, função que assumiu aos 28 anos, e mãe.  Ela nos conta que o perfil surgiu a partir da sua própria solidão quando assumiu o papel de madrasta ao se casar com uma pessoa que já tinha filhos. Depois de ser convidada para falar em um evento TEDx sobre o assunto, decidiu criar uma comunidade que servisse de rede de apoio e acolhimento para mais mulheres nessa função.

Maria Eduarda Machado Parente, 23 anos, filha, enteada, irmã mais velha e gestora da comunidade e de conteúdo do perfil, nos conta que entre os pilares da comunidade estão: a reinvenção da narrativa sobre esta forma de maternar; o combate ao estigma e preconceitos relacionados a como a madrasta é vista pela sociedade, desconstruindo, inclusive, a ideia de que a madrasta é aquela que quer “roubar” o lugar da mãe; desestimular a concorrência entre as mulheres, mostrando que o recasamento é uma realidade; e ampliar o diálogo não só em relação ao tornar-se madrasta, mas também tendo em vista as novas configurações familiares. Outro importante pilar neste grande guarda-chuva é o cuidado com as crianças e a preservação da infância. 

Entre as muitas questões que permeiam este universo, as mais comuns são: a  madrasta vai exercer funções de mãe ou será aquela que somente vai conviver com a enteada ou enteado? Quando a criança chama a madrasta de mãe, qual a conduta que se deve adotar? Como as crianças veem essa companheira do pai que não é a mãe delas? Qual o papel do pai e o posicionamento paterno neste contexto? Quais os impactos de uma separação dos pais para uma criança na infância ou na adolescência? Como enxergar na contemporaneidade as novas configurações familiares?

“Existe autoridade para a madrasta?”

“Madrasta não é palavrão”

Maria Eduarda nos conta que ainda há mais preconceito em relação à madrasta do que em relação ao padrasto. “Não raro, a gente ainda escuta a expressão “boadrasta”. Em relação aos papeis de gênero, o padrasto ainda é o herói, aquele que assume uma família que não é sua e os filhos da mulher; já madrasta é palavrão, a mulher que está tentando ocupar o lugar da mãe e “roubar” o pai da família. “Todos esses estigmas, logicamente, se apoiam em alguns eixos. Um deles é o processo histórico, em um tempo no qual não havia a possibilidade de recasamento, pois ainda não existia a lei do divórcio, e, portanto, só quando a mãe falecia, o homem tinha o direito de se casar novamente. Sem contar a herança do patriarcado e da nossa cultura machista. Outra questão foi a construção da figura da madrasta como a vilã, a bruxa, a má, uma ideia reforçada pelos contos de fadas e fábulas da Disney. Dois contextos muitos fortes que ainda impactam o papel da madrasta”. 

Maria Eduarda Machado Parente
(gestora da comunidade e de conteúdo do perfil)
Foto: @somos.madrastas

Após uma campanha de dois anos encampada pelo movimento @somos.madrastas, a plataforma de buscas Google deixou de exibir definições pejorativas da palavra “madrasta”. “Por meio de um abaixo-assinado conseguimos derrubar da plataforma de buscas a definição de madrasta como “mulher má” e “de que provêm vexames e dissabores”. Inclusive, o “ma”, de madrasta vem de mater, de materna e não de malvada. Hoje, a resposta que aparece é bem diferente e neutra, sem viés de gênero: “mulher em relação aos filhos anteriores da pessoa com quem passa a constituir sociedade conjugal”. Temos consciência de que mudar um dicionário não muda a construção social negativa em torno das madrastas, mas é um passo importante”.

Maria Eduarda ressalta que nos Estados Unidos existem diversos livros que falam de forma muito mais adequada sobre a relação entre a madrasta e o enteado. No Brasil, com o surgimento de mais perfis que falam sobre o tema madrastidade, a torcida é para que os livros infantis passem a abordar a temática de forma mais saudável e afável. “É claro que existem madrastas que escolhem não se envolver nos cuidados diários dos filhos da pessoa com quem se relaciona, mas nós incentivamos que essas mulheres façam isso. Primeiro, para ocupar esse lugar de madrasta e, segundo, porque a nossa causa é a causa das crianças, então, ter mais um adulto para cuidar e ser mais uma fonte de amor não é, de nenhuma maneira, algo ruim”. 

E para quem não sabe, a madrasta tem um dia só dela, e que não é a mesma data do Dia das Mães. No primeiro domingo de setembro se comemora o Dia da Madrasta, apesar da data não ser oficial, tem todo um significado simbólico. 

Mariana Camardelli (idealizadora do @somos.madrastas) e Maria Eduarda Machado Parente (gestora da comunidade e de conteúdo do perfil)
Foto: @somos.madrasta

Conteúdos

No Diário da Mari, todo dia uma treta, reflexão, desabafo  e loucurinhas, disponível no feed do perfil. Você também pode se inscrever para receber conteúdo por e-mail. O @somos.madrastas também conta com uma Rede de Terapeutas, especialistas em Educação Parental, pediatras, psicanalistas e assistentes sociais, profissionais capacitadas para acolher e cuidar com afeto das questões das madrastas.  

Saiba mais:

Instagram: @somos.madrastas

Spotify: Ouça a entrevista com Maria Eduarda Machado no Projeto Entre Elas – EP. 102

Patrizia Corsetto é jornalista, radialista e psicanalista e assina a coluna Entre Elas da Hora do Sabbat semanalmente. 

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