Cantora, compositora e violonista Badi Assad – artista brasileira que construiu carreira internacional em um tempo que não tinha a seu favor, redes sociais ou internet, e em um universo bastante masculino – completa este 35 anos de carreira
A imprensa norte-americana carinhosamente apelidou Badi de “One woman band” (Uma mulher banda, diante de seu virtuosismo ao misturar voz, violão e percussão em suas composições. Em 1989, lançou seu primeiro álbum “Dança dos Tons” e logo chamou atenção pela sua originalidade. Sua carreira internacional decolou com a gravadora Chesky Records, sendo reconhecida como uma das melhores artistas brasileiras. Após se mudar para os Estados Unidos, em 1998, lançou o aclamado álbum “Chameleon”, ampliando ainda mais seu reconhecimento global.
Ao longo dos anos, colaborou com diversos artistas, recebeu prêmios e participou de iniciativas sociais e culturais. Seu legado continua em constante evolução, com lançamentos recentes como o CD “ILHA” (2022) e projetos como “Mulheres do Mundo” (2024), evidenciando sua inabalável criatividade e compromisso com a música e a arte. Também em 2024, lançou ao lado da Orquestra Mundana Refugi, Olho de Peixe, releitura do disco homônimo de Lenine em parceria com o percussionista Marcos Suzano. Ainda em 2024, lançou Bentu, ao lado de Sérgio Pererê.
Trajetória
Batizada como Mariângela Assad Simão, nasceu em 1966, na cidade de São João da Boa Vista (interior de São Paulo), mudando em seguida para o Rio de Janeiro, onde ficou até os 12 anos. Seus pais, Jorge e Angelina, decidiram mudar-se com a família para o Rio em 1969, para proporcionar aos seus irmãos Sérgio e Odair, aulas de violão clássico com a Argentina Monina Távora, pupila do grande Andrés Segóvia. Em meados dos anos 1980, já como Duo Assad, eles ganharam reconhecimento e popularidade internacional.
Badi queria seguir seus passos, mas por ter aprendido piano primeiro, só se interessou pelo violão aos 14 anos. Todavia rapidamente dominou o instrumento e em menos de 1 ano, já dividia o 1º lugar como melhor violonista ao lado de Fábio Zanon, no ‘Concurso Jovens Instrumentistas’ (RJ). Com 19 anos levou o prêmio de melhor violonista brasileira no ‘Concurso Internacional de violão Villa-Lobos’ (RJ) e com 20 anos foi escolhida para representar o Brasil no ‘Concurso Internacional de Viña Del Mar’, no Chile. Enquanto os concursos aconteciam Badi estudou música na Universidade do Rio de Janeiro – Uni-Rio.
Em 1989, gravou seu 1º álbum ‘Dança dos Tons’. No ano seguinte foi escolhida como cantora (entre 200 mulheres) para fazer parte do elenco do musical ‘Mulheres de Hollanda’, com direção de Naum Alves de Souza e a cineasta Marily da Cunha Bezerra apostou em seu talento para compor a trilha do curta-metragem ‘Rio de Janeiro, Minas’, em uma adaptação livre para um trecho do romance de Guimarães Rosa ‘Grande Serão: Veredas’.
Neste período Badi descobriu o prazer das experimentações vocais e percussivas, começando a incorporá-las em suas manifestações artísticas. Naturalmente uma sonoridade original surgiu e um estilo novo se revelou. Com forma única de misturar voz, violão e percussão, Badi foi logo contatada pelo selo Norte-Americano Chesky Records, para o que seria seu primeiro contrato. Assim deu-se início ao processo ascendente de reconhecimento internacional. Pouco tempo depois a imprensa norte-americana já estaria se referindo a ela como uma das melhores artistas oriundas do Brasil e carinhosamente a apelidaram de ‘One woman band’ (Uma mulher banda). Com suas peculiaridades e virtuosismo, convites para apresentações com outros artistas começaram a chegar e rapidamente Badi estreou nos mesmos palcos de artistas como George Benson, Mariza, Bob McFerrin, Toquinho e Naná Vasconcelos, entre tantos outros.
Discografia
Em 1994, Chesky Records lançou ‘Solo’, seguido de ‘Rhythms’ (1995) e ‘Echoes of Brazil’ (1997). A cada lançamento seu prestígio internacional aumentava. Em 1994, a revista Guitar Player a escolheu entre os 100 melhores artistas do mundo! Já em 1996, a Classical Guitar considerou-a, junto com artistas como AniDiFranco, Ben Harper e Tom Morello, como um dos 10 jovens talentos que revolucionariam o uso dos violões nos anos 1990. ‘Rhythms’ foi considerado uma das gravações mais importantes de 1995 e a revista Guitar Player a prestigiou com o prêmio de melhor violonista do ano, assim como ‘Rhythms’ o melhor CD, na categoria violão acústico.
Em 1998, Badi se mudou para os Estados Unidos para investir em sua carreira e lançou ‘Chameleon’, para a gravadora i.e.music/Polygram. Neste projeto trouxe, pela primeira vez, um repertório composto majoritariamente por suas músicas, compostas em parceria com o ex-integrante da banda ‘Megadeth’, Jeff Scott Young. O álbum foi um sucesso internacional e sua música ‘Waves’ ficou entre as dez mais tocadas durante semanas na Espanha, assim como foi escolhida para integrar a trilha do filme ‘It runs in the family’ (estreando Michael e Kirk Douglas).
Todavia, três anos de mudanças radicais se seguiram após o lançamento de ‘Chameleon’. Dentre elas, a descoberta de uma incapacidade motora (distonia focal) que a impossibilitou completamente de tocar violão por quase dois anos. Em período sabático, dedicado à sua reabilitação, Badi virou referência no assunto, sendo uma das primeiras (e poucas) pessoas a se recuperar da distonia no mundo. Neste processo Badi se reinventou como uma intérprete de força incontestável. Depois da recuperação, ela retornou ao Brasil e no começo do novo século, já estava de volta à cena musical, ao lado dos conceituados guitarristas de jazz Larry Coryell e John Abercrombie, no projeto ‘Three Guitars’, lançado pela Chesky Records. No mesmo ano, ela relançou seu primeiro álbum, agora digitalizado, com o título ‘Dança das Ondas’, pela gravadora Belga GHA. Também neste ano foi criadora e apresentadora do programa de rádio ‘Mulheres no Mundo’, pela Rádio Cultura FM.
No ano seguinte, Badi assinou contrato com a aclamada gravadora Alemã Deutsche Grammophon e lançou ‘Verde’, com um repertório formado por uma inusitada mistura de releituras para clássicos do cancioneiro brasileiro e internacional, além de suas próprias composições. Badi novamente mostrou-se ao mundo com originalidade e competência. ‘Verde’ misturava Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira (Asa Branca), com Adoniran Barbosa e Vinícius de Morais (Bom dia tristeza), Björk (Bachelorette) e U2 (One.
Em 2005, se uniu os irmãos, pais e sobrinhos para a gravação ao vivo de ‘A Brazilian Songbook’ e o DVD ‘Um momento de puro amor’, pela GHA. A família finalmente se unia nos palcos. Nesta ocasião, a matriarca Angelina foi chamada de ‘A Billie Holiday brasileira’ pelo LA Times, e Jorge (o pai) revelou seu talento ao bandolim. E assim o mundo começava a entender os segredos por trás do DNA musical, algo que já havia se pronunciado com o curta-metragem ‘Suíte Assad’, de Joel Pizzini (2002).
Em 2006, Badi lançou ‘Wonderland’, e continuou com seus arranjos inusitados para Eurhythmics, Vangelis, Tori Amos, Cartola, Lenine.
Com a participação do cantor carioca Seu Jorge, a regravação de ‘Vacilão’ (canção de Zé Roberto popularizada na voz de Zeca Pagodinho) ganhou roupagem de blues e virou hit nas rádios brasileiras. Acontece que no caldeirão de som da Badi qualquer mistura é possível, porque ela consegue, de uma forma sempre inusitada, combinar música popular com erudita, música experimental com tradicional, rock com baião, batida ritmada com arpejos. Seu próximo CD ‘Wonderland’ entrou para a lista dos melhores 100 do ano pela conceituada BBC de Londres.
Em 2007, Sofia, sua primeira filha, nasceu e Badi recolheu-se. Porém continuou ativa. Ainda sob efeitos da maternidade foi responsável pela trilha da peça teatral infantil ‘Convocadores de Estrelas’, do grupo ‘Seres de Luz’, emprestou sua voz para ‘Barulhinho Ruim’, música tema da personagem Bel, criada especialmente para a reestreia de Vila Sésamo, na TV Cultura, e voltou a compor para a grande tela, quando a cineasta Denise Zmekhol a convidou, ao lado de Naná Vasconcelos, para compor a trilha do documentário ‘Children of the Amazon’, narrando o impacto que as famílias nativas sofreram na ocasião da construção da rodovia Transamazônica, no coração da floresta.
Em 2010, Badi e sua família participaram do álbum vencedor do Grammy como ‘Best Classical Crossover Album’, ao lado de Yo-Yo-Ma. lançou, pela Biscoito Fino, o DVD ‘Badi Assad’, comemorando seus primeiros 20 anos de carreira. A direção foi realizada por seu sobrinho Rodrigo Assad e traz no repertório músicas que marcaram sua carreira até então. No mesmo período, ela foi convidada para ser protagonista da ópera contemporânea ‘Ópera das Pedras’, em São Paulo, dirigida por Denise Milan e o norte-americano Lee Breuer (Mabou Mines).
Artista premiada
Nos primeiros anos de Sofia, Badi foi invadida por um período intenso de inspiração e debruçou-se a compor, desencadeando o lançamento de seu primeiro álbum totalmente autoral ‘Amor e Outras Manias Crônicas’ (2012), através de seu próprio selo ‘Quatro Ventos’. Com este projeto Badi conquistou o prêmio de ‘Melhor Compositora pela APCA’ (Associação Paulista dos Críticos de Arte) e sua canção ‘Pega no Coco’ ganhou o 1º lugar no prestigiado ‘USA International Songwriting Competition’. Paralelamente, Badi foi incluída na lista dos 70 mestres da história brasileira do violão, sendo uma entre as três mulheres, assim como a única representante feminina de sua geração, pela Rolling Stones/BR.
Em 2011, em São João da Boa Vista (SP), sua cidade natal, estreou o ‘Festival Assad’, em homenagem aos talentos da família, que vão desde o chorinho (patriarca Jorge), passando pela música erudita (Sérgio e Odair), contemporânea (Clarice), popular (Angelina e Carolina) e world music (Badi). Já passaram pelo Festival nomes como Yamandu Costa, Pau Brasil, Hamilton de Holanda e André Mehmari, Barbatuques e Borgethinho entre tantos outros.
Em 2013, Badi coordenou o lançamento independente da versão em inglês de seu álbum, com o título ‘Between Love & Luck’, nos Estados Unidos e Europa e recebeu críticas fervorosamente positivas. Como consequência foi comissionada pelo Festival de Cinema do ‘Guitar Marathon’, em janeiro de 2014, para compor a trilha do filme mudo chinês de 1934 ‘The Goddess’ e tocá-la ao vivo durante sua exibição, no Teatro ‘Merkin Hall’ (NY). Neste mesmo festival, Badi foi responsável pela curadoria da noite sul-americana, na qual recebeu destaque no NY Times. Neste mesmo ano lançou seu 1º trabalho dedicado às crianças ‘Cantos de Casa’ e com ele recebeu o ‘Troféu Cata-Vento’ (Fundação Padre Anchieta). Mas antes do ano acabar Badi virou colunista, quando foi convidada para escrever semanalmente sobre música, na ocasião da estreia da versão online da TOPMagazine.
Em 2015, Badi foi convidada para trabalhar com a organização, sediada em Chicago, GATC (Genesis at the Crossroads), que tem como foco principal a construção da paz mundial. Com eles, Badi integra, como violonista e vocalista, o grupo multicultural Saffron Caravan, ao lado do vocalista marroquino Aaron Besoussan, do virtuoso alaudista israelense-árabe, Haytham Safia e do percussionista venezuelano Javier Saumme. Além disso, ela atua como palestrante nas mesas redondas promovidas pela GTCA sobre artes e transformação de conflitos, assim como é responsável pelo programa de música para o Genesis Academy Summer Institute, um programa educacional de treinamento de liderança e construção da paz para jovens internacionais de áreas de conflito.
Em 2016 lançou ‘Hatched’, em português ‘Singular’, trazendo no repertório releituras de jovens da cena indie-pop internacional. Nomes como Hozier, Lorde, Alt-J e Momford & Sons tiveram roupagens abrasileiradas. Afinal são esses artistas, na opinião de Badi, que estão trazendo de volta aos jovens do mundo o ato da reflexão, através da música. São artistas que viraram referência quando procuraram verticalidade, ao invés de superficialidade, reintegrando profundidade em seus conteúdos, tanto filosóficos quanto estéticos.
Documentário
Em 2017, Badi foi a inspiração para o documentário sobre sua vida ‘BADI’, do cineasta paulista Edu Felistoque, ganhando como ‘Melhor Filme’ no ‘CineFest de Maracanaú’ (PE). Em maio de 2018, Badi lançou seu primeiro livro ‘Volta ao mundo em 80 artistas’, onde conta, de forma pessoal, a história de 80 artistas que a influenciaram, direta ou indiretamente. Uma coletânea que passou a ser não somente uma homenagem a esses artistas, de cantos, etnias e épocas distintas, como também uma forma de registrar sua admiração e de revelar o impacto que todos tiveram em sua jornada pessoal. Foram eles que, afinal, contribuíram para moldá-la como cidadã do mundo. Em novembro, Badi lançou, ao lado do consagrado slide guitar player Roy Rogers e do virtuoso violinista e harpista Paraguaio Carlos Reyes, o projeto ‘Stringshot’. Em dezembro, ‘BADI’ ganhou o prêmio de ‘Melhor Documentário’ no prestigiado LABAFF ‘LA Brazilian Film Festival’, em Los Angeles.
Em 2020, durante o período de lockdown durante a pandemia, o filme Badi foi selecionado para participar do prestigiado Festival du Cinéma de Paris; duas temporadas da websérie Badi Music, compartilhando muitas de suas ideias criativas musicais, foi lançada em seu canal do Youtube e seu 20º CD Around the World chegou ao mercado internacional, pela gravadora norte-americana Ropeadope.
Em 2021, Badi lançou o projeto Censura na Música Brasileira, o EP Volta ao Mundo com Convidados (com Lívia Mattos, Marcelo Pretto, Swami Jr, Carlinhos Antunes e Fernandinho Beatbox) e a série #baditalks, entrevistando, em sua estreia, a cientista astrofísica brasileira Angela Olinto, que entrou para a Academia de Ciências e Artes e para a Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos, neste mesmo ano.
Em julho de 2022, Badi lançou seu 20º CD autoral ILHA, seguido de tour pelo Brasil. Foi neste ano que a paquistanesa Arooj Aftab ganhou o Grammy de Artista Revelação, com o disco Vulture Prince, onde se encontra a canção Diya Hai, com a participação de Badi. Foi também neste ano que Badi foi vencedora do 6º prêmio de melhor instrumentista do ano, pela Womens Music Event.
Em janeiro de 2023, Badi apresentou o trabalho em progresso ‘Focal, What?’ no Lincoln Center, em Nova York, sendo um notável testemunho de sua contínua evolução artística e de seu compromisso inabalável em expandir os limites da criatividade. Ao longo do ano, ela participou como convidada especial em diversos projetos paralelos de artistas variados, incluindo as compositoras e cantoras Déa Trancoso, de Minas Gerais, e Thaís Morell, do Paraná, o cantor Fábio Nogara, de São Paulo, conhecido como uma recente revelação da internet, e o pianista João Ventura, de Aracaju, reconhecido por sua fusão entre música clássica e popular e por ter sido convidado por Madonna para integrar sua banda. Além disso, Badi participou do 1º Festival da Voz ‘Voxploration’, idealizado por sua sobrinha Clarice Assad e produzido por Elis Ribeirete, na capital paulista.
Em 2024, Badi lançou o projeto ‘Mulheres do Mundo’, com participações especiais da filósofa e poetisa Viviane Mosé e da cantora afrofuturista Larissa Luz.
Fonte: Débora Venturini – Assessoria de Comunicação

Patrizia Corsetto é jornalista, radialista e psicanalista e assina semanalmente a coluna Entre Elas