Certa vez, eu tava ouvindo um podcast e uma das apresentadoras citou que no amor, ela se comporta como uma criança caricata e que talvez isso não tenha dado certo ao longo das experiências, pois a mulher adulta existente dentro dela se fragiliza diante de ser desejada e coisa e tal. Eu me vi tanto nesse lugar e fiquei me perguntando de onde vinha essa perda de identidade e por que eu assumo um papel frágil diante dos meus relacionamentos. A apresentadora do podcast justificou esse comportamento pelo fato de ter sido criada por uma paternidade fechada e fria e isso fez eu me identificar mais ainda. Tentando uma autodefesa, me pergunto se é proibido assumir um papel frágil, se eu só posso mostrar fortaleza em um ambiente onde eu deveria ser transparente e humana, mas de fato, a nossa criação diz muito sobre como a gente se relacionará lá na frente. Na falta de um alicerce familiar, você projetará essa vontade de ser cuidado com mais afinco pelo(s) amor(es) da sua vida – aqueles com os quais você dividirá um teto, principalmente. Isso é uma mini bagunça que a gente tem que organizar, porque a tendência é que, além de apresentar carência extrema, sejamos uma reprodução de quem eram nossos pais, sobretudo, as partes ruins.
Já se perguntou quem são ou quem eram seus pais? Pode ser interessante, mas também doloroso. E mais doloroso ainda é ter essa ciência de se tornar uma continuidade deles. Meu pai, além de um porco capitalista (parafraseando Alexandre Magno, vulgo Chorão), é um leonino vaidoso, engraçadinho e que nunca assume suas falhas, sem contar a extrema agressividade – amenizada com a velhice. Minha mãe tinha um ar autodestrutivo, autodepreciativo e muita vitimização, mesmo sendo muito conquistadora de amizades. Consigo elencar inúmeras características dos dois que me moldam hoje ou flertam com a pessoa que eu quero e não quero ser. Me cobro muito para não ser alguém absurdamente intolerante como meu pai, mas não quero pensar que estou sendo feita de tola, como minha mãe.
Um dia desses, vi um story aleatório que dizia que nossos pais foram traumatizados pelos seus próprios pais que foram traumatizados pelos pais deles e assim, sucessivamente. Resumindo: ninguém tava nem aí pra si e pra quem vinha atrás e então, sobrou pra gente, que chegou na geração das surtadinhas&noiadas, resolver esse pepino. Dito isso, o intuito desse texto não é dar um choque motivacional para você resolver seus b.o’s familiares e nem dizer que desista por não ter mais jeito, mas dizer, para quem se identifica, que você não está só. Só isso.
Comecei a me auto analisar demais quando cheguei aos 30, querendo organizar várias questões internas e externas que, muitas vezes, dependem apenas do tempo. Para conter essa pressa, mas também curtir o processo, comecei – pela milésima vez – a fazer terapia, mas tenho arranjado mil desculpas pra justificar o medo de me autoconhecer de fato. De qualquer forma, entendi que tenho uma lua em Virgem que me faz querer entender e organizar tudo isso dentro da cabeça e perguntar constantemente o porquê desse encontro de duas personalidades tão distintas dentro de mim quando me relaciono com alguém: engraçadinha e estressada, mas que também se fragiliza com facilidade e se sente um lixo.
A minha defesa contra isso tudo é rir de mim mesma e escrever, pois não tô conseguindo controlar minhas animosidades, então reconhecer esses fatos com bom humor me faz ser menos meu pai. E dar a cara a tapa para resolvê-los me faz ser menos minha mãe.

Míriam Pimentel é jornalista pela Universidade Federal de Alagoas, amante da cultura pop, apaixonada por música e pisciana com ascendente em peixes que ama escrever devaneios lúcidos e crônicas embriagadas, não necessariamente nessa ordem.
Uma resposta
Mais um texto perfeito!!! Você é minha escritora favorita!!! Que delícia não me sentir só, fui lendo seu texto e me perguntando ela tava dentro da minha cabeça?! Muito obrigada por compartilhar conosco suas inquietações que também são minhas!!