Neste 18 de maio, Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, o Brasil ergue uma data de denúncia, escuta e mobilização. A escolha do dia não é aleatória: foi instituída em memória da menina Araceli Cabrera Sánchez Crespo, assassinada em 1973, aos 8 anos, num crime brutal que permanece vivo como símbolo da urgência em proteger nossas infâncias.
Essa mobilização não se limita a um único dia. Ela ganha força ao longo de todo o mês com a campanha conhecida como Maio Laranja. Criada pela Lei nº 14.432/2022, a campanha nacional visa ampliar a conscientização sobre a violência sexual contra crianças e adolescentes, promovendo ações educativas, formativas e de mobilização em escolas, espaços culturais, instituições públicas e redes sociais.
O símbolo do Maio Laranja é uma flor. Frágil, mas cheia de vida, ela representa a infância. Cuidar dessa flor é proteger os sonhos e direitos das crianças e adolescentes. E, como toda flor, a infância precisa de luz, água, tempo, afeto — e proteção.

Dados do Disque 100 revelam uma realidade alarmante: em 2023, mais de 82 mil denúncias de violência sexual contra crianças e adolescentes foram registradas no país. Isso significa que, a cada hora, cerca de 9 crianças ou adolescentes são vítimas desse tipo de violência — e sabemos que muitos casos sequer são denunciados. A maioria dos abusos ocorre dentro de casa, cometidos por pessoas próximas, o que torna a revelação ainda mais difícil.
Mas este texto não é apenas sobre o horror. É, sobretudo, sobre caminhos possíveis.
Falar sobre abuso sexual infantil é doloroso, mas necessário. E uma das formas mais eficazes de romper o silêncio é por meio da escuta atenta e da conversa constante. Conversar com crianças sobre seus sentimentos, sobre seus limites e sobre o direito que têm de dizer “não” é um ato de amor e de proteção.
E aqui entram os contos.

As histórias são portais. Elas nos permitem tocar o intocável, nomear o que está escondido, elaborar medos, criar metáforas para dores que ainda não têm palavras. Um conto pode ser o início de uma conversa difícil. Um livro infantil pode ser a ponte entre a criança e o adulto que está pronto para ouvir.
Segundo a psicóloga e educadora sexual Caroline Arcari, autora do livro Pipo e Fifi, “a educação sexual começa com o afeto e o respeito aos limites do outro. E os livros são aliados incríveis para construir esse caminho com naturalidade.”
Narrativas como:
- “Não me toca, seu boboca”, de Andrea Viviana Taubman
- “Pipo e Fifi”, de Caroline Arcari
- “O segredo da lagarta”, de Kiusam de Oliveira
- e contos populares como “Chapeuzinho Vermelho”, quando revisitados com consciência crítica
…podem ser utilizados com delicadeza para iniciar diálogos com os pequenos. Através da fantasia, as crianças podem se ver, se reconhecer e, quem sabe, confiar o suficiente para contar o que está escondido.
A contação de histórias não substitui o trabalho técnico, psicológico ou jurídico. Mas ela pode abrir caminhos. Pode amolecer barreiras. Pode ser a fagulha da confiança.
A boa notícia é que existem materiais gratuitos e acessíveis para apoiar famílias e educadores. Abaixo, alguns links úteis:
- Cartilha “Conversar é Proteger” – Instituto Liberta e Childhood Brasil
- Guia para prevenção do abuso sexual infantil – Defensoria Pública do Estado do RJ
- Livros e vídeos da coleção Pipo e Fifi
Neste Maio Laranja, que a gente fale. Que a gente escute. Que a gente conte.
Porque proteger as infâncias é responsabilidade de todos nós. Informação é proteção!

Camila Genaro é contadora de histórias e escritora para todas as infâncias.