Eu sou mulher Preta!
E, antes de qualquer coisa, quero dizer: Estou cansada! Mas não é só o cansaço do corpo — é o cansaço da alma, da mente, do silêncio forçado, da solidão que grita mesmo quando há gente por perto.
Aprendi, desde cedo, que eu precisava ser forte. Forte pra cuidar dos outros. Forte pra não chorar. Forte pra aguentar o racismo disfarçado de piada, a hipersexualização do meu corpo, o medo constante de ser desacreditada. Forte pra seguir sorrindo mesmo quando tudo doía.
Mas ninguém nunca me perguntou como eu estava de verdade.
A mulher preta sempre foi tratada como invencível — até por nós mesmas.
Existe uma ideia cruel — e muito difundida — de que mulher preta é guerreira por natureza. Que somos sempre as que sustentam tudo, mesmo caindo aos pedaços. Essa imagem da mulher preta que “aguenta tudo” é romantizada, celebrada até. Mas deixa eu dizer: essa imagem nos Adoece.
Sabe o que acontece quando a gente acredita que não pode fraquejar? A gente morre por dentro.
E quando tenta pedir ajuda, muitas vezes ouve: “mas você sempre pareceu tão forte”.
A força que nos impuseram virou uma prisão.
A saúde mental da mulher preta é atravessada por muitos silêncios
Você já se sentiu mal, triste, ansiosa ou à beira de um colapso… mas achou que não podia parar?
Que não podia procurar ajuda porque precisava continuar trabalhando, cuidando dos filhos, estudando, resistindo?
Eu já. Muitas vezes!!!
A saúde mental da mulher preta não é só uma questão individual — ela é política!
É resultado de séculos de opressão, exclusão, violência simbólica e concreta.
Não é coincidência que estejamos entre as mais afetadas por depressão, ansiedade, síndrome do pânico — e ao mesmo tempo entre as que menos têm acesso à terapia e acolhimento psicológico.
Não é sobre falta de vontade. É sobre um sistema que nos exclui de tudo, até do cuidado.
A solidão da mulher preta é estrutural.
A solidão que sentimos não é só afetiva.
É socia, emocional, psíquica.
É entrar em uma sala de trabalho e ser a única preta.
É ser tratada como invisível em espaços onde somos maioria na base e minoria na liderança.
É ter o corpo desejado mas não AMADO.
É não ter com quem conversar sem precisar se explicar
É carregar a dor da ancestralidade sem espaço para a cura.
E isso tudo, Adoece.
Adoece silenciosamente.
Porque, para o mundo, a gente está “sempre bem”. Porque para o mundo, nossa dor não comove.
Quando encontrei um espaço de escuta, comecei a me curar
A primeira vez que sentei para conversar com alguém que realmente me escutou, sem julgamentos, percebi o quanto eu estava acumulando.
Pude falar sem precisar justificar ou suavizar a minha vivência.
Ali, entendi que minha dor era legítima — e que eu não precisava carregar tudo sozinha.
Foi um ponto de virada.
O processo não é rápido nem fácil, mas é real. É possível.
Buscar ajuda não me fez menos forte. Me fez mais consciente de mim.
Entendi que cuidar da saúde mental é parte da luta, não fuga dela.
Cuidar da mente é um ato de
RESISTÊNCIA!!!
Quando a gente se cuida, quando descansa, quando diz NÃO.
Quando silencia para se ouvir…
A gente está rompendo com tudo o que esperam de nós.
A gente está dizendo: Eu não sou só dor.
Eu sou vida!E mereço viver com dignidade.
A gente não precisa adoecer para ser ouvida.
Não precisa carregar tudo sozinha para ser valorizada.
E definitivamente não precisa ser forte o tempo todo.
Se você é mulher negra e está lendo isso: Você não está sozinha!!
Você não está exagerando!
Você não está sendo fraca!
Você não está ERRADA por sentir o que sente.
E você merece cuidado, escuta, acolhimento.
A sua saúde mental importa. A sua vida importa!
A casa que eu habitava
Havia uma casa dentro de mim.
Antiga, escura, silenciosa.
Os cômodos cheiravam a memórias mofadas,
e as paredes eram feitas de palavras não ditas.
Eu vivia lá.
Pisava leve para não incomodar,
guardava a dor em gavetas trancadas
e pendurava sorrisos falsos nas janelas.
Todo dia varria os cacos do que não suportava sentir,
escondia debaixo do tapete a raiva, o medo, a solidão.
Ninguém visitava.
Ninguém via.
Ninguém sabia.
Meu teto era o silêncio.
Meu chão, o cansaço.
E eu me acostumei a existir sem barulho,
sem espaço, sem alívio.
Até que um dia,
com mãos firmes e olhos que me escutaram de verdade,
alguém acendeu uma luz.
Não veio com promessas nem com pressa.
Veio com escuta. Com acolhimento.
E me disse que aquela casa podia ser reformada.
Ali, na sala da terapia,
descobri que dor nomeada não vira prisão.
Que choro não é fraqueza — é limpeza.
Que sentir é viver inteiro.
Fui abrindo janelas.
Desempacotando traumas.
Reorganizando móveis internos.
E pela primeira vez, me sentei no centro de mim.
Hoje, a casa ainda tem dias nublados,
mas há cortinas leves,
plantas crescendo nas janelas,
e um espelho que finalmente reflete quem eu sou.
Fui salva.
Não por milagre,
mas por mim mesma —
quando escolhi falar, sentir, existir.
( Tay Oliveira)
Indicações de acolhimento com recorte racial:
Terapretas ( Instagram )– casa que acolhe mulheres, com método próprio que alinha espiritualidade, psicanálise e terapias naturais.
Psiafro ( Instagram)– coletivo focado na saúde mental da população negra, oferecendo acolhimento e práticas afro referenciadas.
Cuidar de si não é egoísmo. É recomeço. É rebelião. É ancestral.
E se a cura é coletiva, eu sigo com você!
Com amor, coragem e militância.
Tay Oliveira ✊🏾🖤