Mulheres na Cena do Rap

O movimento hip hop surgiu na década de 80 e ganhou grande visibilidade e adeptos na década de 90 no Brasil, com os Racionais MC ‘s, Pavilhão 9 e Detentos do Rap. Essa prática era vista de forma preconceituosa pela sociedade embranquecida e rica de São Paulo, e de outros estados do país. Isso porque o rap nasceu no asfalto, nos becos e vielas da periferia, representando a voz do povo negro, pobre e periférico, e que viviam em sua maioria, em situação de vulnerabilidade social. Esse movimento foi crescendo através das letras das músicas que denunciavam as violências do estado ao negar direitos sociais ou agir de forma truculenta com o povo da favela. 

O Rap é uma representação da cultura popular de um povo que aprendeu a resistir através das músicas, das letras que atravessam o peito e varam as madrugadas sonhando utopias, e trilhando caminhos possíveis apesar de alguns obstáculos na jornada da vida. O rap para muitos e muitas é uma filosofia de vida, é fortalecimento coletivo, é acolhimento e afeto que fazem do rap a sua morada, a sua forma de se expressar para o mundo. E é nesse espaço que as mulheres lutam desde a origem do hip hop por reconhecimento e travam uma longa luta pela participação ativa nessa cultura que historicamente foi dominada pelos homens. 

Mas vocês já pensaram que esse espaço também é e precisa ser ocupado por mulheres? Que esse espaço, ainda muito machista, pode ampliar a participação e as vozes femininas? Que palavras são usadas como ferramenta de luta contra o patriarcado? Já pararam para pensar em quantas mulheres rappers vocês conhecem? Ouvem e consomem artisticamente? Pois é, esses são questionamentos que considero importantes para refletirmos sobre o universo do hip hop e as lutas que as mulheres carregam no dia a dia do rap no Brasil. 

 Para bater um papo bacana com a gente sobre a participação das mulheres no rap, convidei uma jovem mulher, poeta, grafiteira, rapper de batalhas e artista marginal, mas poderia também a chamar de extraordinária, ela é a única mulher a batalhar em sua cidade, Alana é o nome dela, mas conhecida nas batalhas de rap como Froyd. 

[Froyd] Quem é Froyd?

Froyd é cria da favela, nasceu e cresceu nela, mulher indígena e cigana da etnia Calon-Puris, buscou a poesia como conforto, grafiteira, artista gráfica urbana, rapper de batalhas, compositora e artista marginal.

[Froyd] O que é o Hip Hop para você? 

Hip Hop é a metade de mim, é minha segunda casa e a revolução de todas as vozes que foram caladas por séculos de luta e resistência. O que me faz acreditar que ainda é uma cultura permanente na minha vida.

[Froyd]Como iniciou a sua participação e interesse no movimento? 

O motivo pelo qual eu me entreguei a esse movimento é a união, sabe? A família que nós viramos. O interesse veio desde pequena, quando eu criança e ia ver batalha de rima, onde minha vó e eu, vendíamos milho em frente à estação de metrô, em Jaboatão Velho, aquilo pra mim foi tudo! Vi a esperança da comunidade, e coloquei isso nas minhas mãos. Comecei a conhecer mais e fui me salvando dos traumas que vivi e das violências de tudo, ali me senti.

[Froyd] Como você enxerga a participação das mulheres do Hip Hop no Brasil? E localmente em sua cidade, Surubim?  

Não é tão frequente ver mulheres aqui em Surubim rimando, mas quando tem, eu imagino as palavras que fui vítima de preconceito e de machismo se quebrando, vejo tudo de ruim que me aconteceu indo embora, para mim isso é forte e me traz uma sensação de que eu não estou sozinha.

[Froyd] Qual o sentido de fazer rap para você?

Nasce em mim todos os dias uma nova era, só de ouvir outras pessoas se expressarem e viver do rap, me faz ter a certeza que é isso que eu quero, esse é o sentido de trazer a verdade e a esperança.

[Froyd] Você acha esse espaço machista? Porque? 

Eu tenho certeza que é machista. Creio que veio por conta da cultura do machismo, e esse preconceito nasce em todos os lugares relacionados a cultura e onde tem mulheres lutando por direitos.

[Froyd] Se sim, de que forma você acha que o machismo se manifesta nas batalhas?  

Na questão de menosprezar a rima da mulher, dizer que ela nunca vai ganhar a batalha, comparar a força dele (masculina) com a nossa, comparar a gente com outras mulheres, e dizer que temos sempre panelinha na hora da votação.

[Froyd] Como é ser a única mulher nas batalhas em Surubim-PE? 

É difícil, sofri diversos assédios, vivo lutando contra o preconceito, mas apesar de tudo, é gratificante ver meu pódio se conquistando aos poucos pelo o que eu sou.

[Froyd] O que você acha que falta para as mulheres se sentirem mais acolhidas nesse espaço?

Creio que o respeito, que não existe, a falta de acolhimento quando somos vítimas de qualquer violência. Estar sempre falando sobre nós mulheres e pessoas LGBTQIAPN+ nesse espaço, e é importante trazer também a falta de igualdade de gênero entre nós.

Acredito muito no poder de movimento que nós mulheres possuímos, porque quando nos movemos, o mundo se move junto. Essa voz de Froyd é também a voz de muitas mulheres, que prendem na garganta tantas palavras, vontades, expressões, desejos e liberdades. Que possamos falar, botar pra fora o que nos angustia e ao mesmo tempo o que nos liberta. Enxergo o rap como uma ponte de transformação, de luta, mas também de resistência. Quem dessa fonte bebe, percorre um caminho aberto para poesias, causos e fatos.  

Agradeço demais a sua participação nesse espaço tão valioso de diálogo, trocas e partilhas das nossas grandezas e potências, por sermos mulheres diversas e por estarmos ocupando tantos espaços onde nossas vozes são tão necessárias, onde nossos olhares e participação ativa fazem total diferença. Você é uma mulher inspiradora, ousada e determinada, que através da sua voz e da sua coragem atravessa o preconceito, desconstrói o machismo nas batalhas e defende os direitos e a participação de mais mulheres no movimento hip hop. Vida longa nessa jornada, forte abraço querida ♥️🌻

Abaixo deixo links de mulheres rapper referências no rap nacional.

MC Bione

https://youtu.be/00ih8P931fw?si=veRubBiZmnJk8Ga8

Poetisas no Topo – Mariana Mello | Nabrisa | Karol de Souza | Azzy | Souto | Bivolt | Drik Barbosa

https://youtu.be/oZYIIPPLfjY?si=jwUDIl6nPLi73tDk

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